Roofless Vagueiam desassombrados numa urbe sentenciosa. Remetidos aos seus esconderijos arcam com os reflexos do espelho em que a cidade não se revê. Este, munido de um litro de tinto, sentou-se, junto a mim, sobre o recosto de um banco na Avenida da Liberdade. O gorro preto escuda a carapinha desgrenhada e a roupa exala um fedor nauseabundo. Usa perfume de homem? Pergunta-me. Assevero-lhe que não. Deixei-me há muito disso. Usa perfume de homem? A pergunta, em tom desafiador, subentenderia outra interrogação? Que tipo de homem és tu? Cães cheiram cães como forma de mútuo reconhecimento. Que espécie de homem fora ele em tempos? O seu despojamento voluntário? A resignação à condição de indigente alguma táctica de sobrevivência? Lançaria sobre outros como eu um olhar jocoso por se renderem aos trâmites de uma sociedade por ele enjeitada? Daí a sua altivez e o semblante risonho ciente de que escolhera a melhor vereda entre os socialmente desobrigados? Noutro ponto da cidade uma réplica. Outro sem-abrigo. Este de rasta espessa e fungosa, o mesmo ar altivo. Empoleirado no encosto de um banco de miradouro fumega da boca e do nariz em simultâneo, absolutamente alheio às circunstâncias. O charro macera-lhe a alma imersa na mais silente distopia. À vista, o Tejo no ocaso da tarde matizado por luzes de barcos imóveis. A cidade é deles.