BarelyIn some ways, Ashley is the musical counterpart of David Lynch, a detective of weird secrets amid everyday life, but he's a gentler, more compassionate spirit.
.............................................................................................................................................................................
AE -
How do you compose your operas?RA -
Invariably there is a vision (that I barely understand) of a new kind of music and a vision (that I barely understand) of a story to be told. I work on them at the same time, barely able to tell the difference in what I am working on.
HandsNão voltaremos a levar as mãos ao rosto. Ao mínimo ensaio seremos alcunhados de copistas, cábulas, plagiários, falsários. O músico de jazz que volte a poisar as mãos sobre as faces será impiedosamente votado ao ostracismo, vexado por melómanos, escorraçado da indústria, rasurado da história. Miles Davis e Dizzy Gillespie esgotaram o filão. Uma guerra travada palmo a palmo entre três titãs. Um
sprint renhido, dirimido à unha. Em causa estava a máxima sublimação do
rosto do jazz. O fotógrafo não se compraz e completa como singelo tecnicista. É director, encenador, compositor, coreógrafo. O seu génio afere-se sopesando detalhes ínfimos. Milimétricos. Uma bochecha enfunada, a pele arrepanhada, mãos um nada mais acima, dedos longilíneos ou roliços, olhos arregalados, semicerrados ou comprimidos, o labor da luz sobre o carácter da cútis, a sugestão de pudicícia, deslumbramento ou transe criativo. Em suma, o drama que trespassa a composição. Prova-o a
nota de Corbijn. Penn suplanta Corbijn. Quatro anos depois o holandês descobre-se de novo superado por Ritts. A distorção subjectiva do olhar impera escandalosamente na ordenação deste pódio.
FingerOlhar dócil e sorriso livre. O pior são as mãos. Testemunhas de histórias inscritas num corpo esquivo aos azedumes de uma cidade intraduzível. As conveniências humanas e simbólicas da cidade escapam-lhes constantemente, como névoas. Como a palavra debaixo da língua que não ascende ao cérebro. Os dedos enrolam uma lasca de pedra lunar que imprime em seguida um curso volante aos sentidos. Equaliza-se o real.
Rush
Uma cidade lenta em que certos e determinados factos podem suceder-se a uma velocidade atordoante.
NarrativasO ciclo
Grandes Lições do fórum
Estado do Mundo em curso na Gulbenkian sofreu um golpe de altíssimo teor irónico. À última hora foi cancelada a conferência do arquitecto jordano Rasem Badram, intitulada
Reflexões Sobre a Narrativa do Lugar, ou sobre, infere-se, como os lugares, mormente citadinos, são em larga escala uma construção vivencial, afectiva. Ao que consta Badram fora impedido de deslocar-se a Lisboa pelas autoridades de Amã. Daí resultariam por certo pungentes reflexões sobre
lugares e suas narrativas. Quanto a sub-narrativas, releve-se o facto de nada de substantivo se encontrar via
Google ou
Wikipedia sobre este proeminente(segundo o site do Estado do Mundo) arquitecto e professor jordano. Não admira que toda a imprensa tenha reproduzido de modo assustadoramente mecânico o
press release da Gulbenkian sobre o mesmo.
Mute
Quando estiveres aborrecido, senta-te num café com vidros grossos que impeçam que até ti chegue o som da rua. E olha para as pessoas que passam. Quando retirares um elemento da vida - o som, neste caso - verás que tudo é uma dança sem fim, insólita, completamente conjugada.
HamPreocupava-se principalmente com os sapatos de ambos. Com isso e com a comida. Sempre a comida. Num velho fumeiro feito de tábuas encontraram um presunto pendurado num recanto alto. Parecia desenterrado de uma sepultura, de tão ressequido e mirrado. Ele cortou um bocado com a faca. A carne era vermelho-escura e salgada, com sabor intenso e agradável. Nessa noite, fritaram grossas fatias na fogueira e depois cozinharam-nas em lume brando com uma lata de feijão. Mais tarde, ele acordou nas trevas e pareceu-lhe ter ouvido grandes tambores tribais a rufarem algures nos montes escuros. Depois o vento mudou e ficou apenas o silêncio.
The Clinton
Ouvem-se belos estardalhaços na televisão. Não há demasiado tempo um tipo novo reiterava o difícil, senão o impossível, que é ser-se amigo de um grande escritor. A ideia mil vezes estucada de que a psique de cada escritor fenomenal comporta um arrozal de idiossincrasias insuportáveis. Ou estoutra ainda. A de que a vil companhia de jornalistas e psiquiatras é de longe preferível à proximidade de escritores, canibais ficcionistas para quem todos, em particular os íntimos, constituem presas indefensas de todo irresistíveis. Há tempo suficiente para que o registo já se tenha varrido das placas de memória de curta duração dos telespectadores, o labirinto de genialidades e peculiaridades temperamentais que dá pelo nome de António Lobo Antunes declinava a mais remota hipótese de partilhar a casa com uma escritora. Explicou-se. De novo o pavor das idiossincrasias e obsessões advinháveis entre escritores. Tão monolítica recusa de Antunes exacerbou entre os telespectadores a suspeita de que Paul Auster e Siri Hustvedt seriam o casal Clinton da literatura contemporânea.
IklimlerUns classificam-na, embeiçados, como a melhor coreografia(cena) de sexo produzida pelo cinema de autor nos últimos anos. Outros receiam e lamentam que os primeiros sejam capazes de ter razão.
By the bookObservou certa vez um escritor célebre que um bom livro deve desencadear mudanças na vida do leitor. Por exemplo, levá-lo a regressar contrafeito - mais ainda, bastante mais - ao local de trabalho e se possível compeli-lo a despedir-se - a menos, óbvio, que o emprego seja ele próprio uma obra-prima. De um livro fora de série, vaticina, espera-se que tenha o poder de bulir com as vísceras do ser humano, de condicionar-lhe o destino. Obras suas, assegura, levaram dezenas de jovens a partir. A partir, simplesmente. Alguns abandonando para sempre comodidades burguesas. Enquanto isso o autor permaneceu acoitado na mesma pensão parisiense décadas a fio languidamente entregue à mitificação de si mesmo como escritor preguiçoso. Uma frase ao amanhecer e o resto do dia cinzelando-a, gabava-se. Em jeito de nota de rodapé, um saldo carnal confesso de cerca de duas mil mulheres.
Drugstore
À ceci je répondrai que si l'on pouvait se procurer une femme aussi facilement qu'un verre de gin ou qu'un paquet de gauloises et si l'on avait le loisir, comme l'alcool et la cigarret, de la déguster en plein air sans être obligé de l'enfermer dans une chambre sale et pas appétissante, l'alcoolisme e l'intoxication disparaîtraient promptement; ou retrouveraient à tout le moins des proportions acceptables.
Doisneau is dead Or just too much of ecstasy pills...
Blow jobA definição pessoana de Coca-Cola -
primeiro estranha-se, depois entranha-se - fora já glosada a torto e a direito, a propósito de quase tudo, mas nunca, assim sugerem os registos, a propósito do broche. De facto, o
slogan esgalhado por Pessoa define exactamente o processo de adaptação ao
fellatio, encarado sobretudo do ponto de vista feminino. Regra geral(estatística pessoal e inalienável), na estreia estranham. Abocanham timoratas o falo, manuseiam-no segundo um combinado de pudor, ansiedade e nojo, arreliam-no desastradas com os dentes, titilam a glande com a língua espetada qual bezerras, esboçam esgares dilemáticos, emulam ao ridículo fragmentos retidos de filmes pornográficos. Hesitam entre manter os olhos abertos ou cerrados. Entre fixar os olhos, o umbigo ou a pelvis do homem. Engasgam-se, tossicam. Soltam risotas e soluços encavacados. Queixam-se da boca seca, do sufoco decorrente da pressão exercida pela mão do homem contra a nuca e de dores mandibulares. Embaraçadas, recalcitrantes, acossadas por supostos bloqueios morais, desistem. Assumem-se incapazes, não vocacionadas para o acto. São de novo tentadas, cedem e novamente desistem. Três dias decorridos(nos casos mais morosos), e afinal, é como se o tivessem executado toda a vida. Mistério dos mistérios, a coisa ganha voluntarismo, alma, avidez, arte, língua, saliva, volúpia, fome. Pior, torna-se-lhes indispensável.
Um vício.
ArtTem de haver uma escuridão total à volta da tela, para que o pintor fique hipnotizado pelo seu trabalho e pinte quase em estado de transe. Deve manter-se o mais perto possível do seu mundo interior, se quer transcender os limites que a razão tenta continuamente impor-lhe.